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Universitários do UNASP discutem racismo nos dias atuais durante Fórum para Questões Afro-Indígenas

No decorrer dos últimos cem anos, o UNASP campus São Paulo recebeu grande quantidade de alunos de diversas culturas e regiões do mundo. Com uma história que presenciou duas grandes guerras mundiais, o desenvolvimento do centro universitário a partir do início do século XXI contribuiu para o fortalecimento de pesquisas e discussões a respeito da […]

Texto: Redação

No decorrer dos últimos cem anos, o UNASP campus São Paulo recebeu grande quantidade de alunos de diversas culturas e regiões do mundo. Com uma história que presenciou duas grandes guerras mundiais, o desenvolvimento do centro universitário a partir do início do século XXI contribuiu para o fortalecimento de pesquisas e discussões a respeito da diversidade racial e cultural. A partir do surgimento do Núcleo de Diversidade Étnico-Racial, todos os anos esses temas são debatidos no Fórum para Questões Afro-Indígenas na Contemporaneidade. No dia 23 de agosto, pela manhã, aconteceu no auditório Ellen White a quinta edição do fórum que reuniu especialistas, pesquisadores, representantes de etnias, universitários do UNASP e de outras universidades.

A cada edição aumenta a participação de universitários de diversas áreas. Entre eles, o estudante do curso de Educação Física do UNASP-SP, Gustavo Santana. A temática o incentivou a realizar seu projeto de pesquisa para conclusão do curso intitulado: “Movimento Hip Hop, Possibilidades como Instrumento Educacional”. Ele estudou como o Hip Hop pode ser aplicado ao ensino através da disciplina de Educação Física na escola. Os resultados foram apresentados durante o fórum. Outra pesquisa apresentada no fórum pela professora Eunice Bertoso, conduzida por ela e pela estudante de Pedagogia, Stefani Gonçalves, analisou como a diversidade racial é tratada na sala de aula. A pesquisa, que ouviu professores que lecionam no Ensino Infantil de uma escola municipal na Zona Sul de São Paulo, concluiu que a escola e os professores podem ajudar o aluno a descobrir sua identidade junto aos amigos no ambiente escolar.

O representante da tribo Tenondé Porã, o índio e professor, Tiago Karai, compartilhou com a plenária os desafios que os índios enfrentam na atualidade. Ele conta que é necessário provar ser índio para ter acesso aos seus direitos. Como educador, defende que a escola deve ensinar qual é a realidade do índio.

Representando a temática africana, o historiador e pós-doutor em História com ênfase em História da África, Amailton Azevedo, deu uma aula sobre o racismo no Brasil. Suas análises surpreenderam o público. Segundo ele, o racismo ainda ganha fôlego no país porque, diferente do que aconteceu em países como África do Sul e Estados Unidos, o racismo no Brasil nunca foi lei. Por isso, uma das últimas nações a abolir a escravidão, nunca teria combatido o racismo que ainda se manifesta de forma sútil e institucional.

Como exemplo dessa realidade, o especialista citou a prevalência de homens brancos nas esferas públicas dos poderes civis e militares. Também comparou o quarto da empregada a uma micro senzala. Explicando, dessa forma, como são sutis a desigualdade racial e a discriminação. “Se propagou ao longo do século vinte que aqui no Brasil nós não tínhamos problemas de raça. Como era um povo miscigenado, para que pensar nessas questões na medida em que isso não ocorria? No entanto, quando se voltava para questões em torno de educação, moradia, saneamento, saúde mental, criminalidade, violência e drogas, víamos que a população negra era a que estava mais vulnerável”, ressaltou.

Para Azevedo, a proposta do fórum contribui para a construção de uma consciência para a democracia racial, a ideia que defende para solucionar o racismo brasileiro. “Do ponto de vista da reflexão, ajuda a pensarmos o Brasil como uma possibilidade de alcançar a ideia de que podemos chegar a uma democracia racial. Para que esse povo brasileiro possa ter acesso exatamente a educação, a saúde, ao lazer, a viagem e a cultura da mesma maneira que certos grupos privilegiados que, coincidentemente, são brancos”, considerou.

Negra e natural de Angola, a estudante de Psicologia, Wami Zua, conta que consegue perceber a mudança no comportamento das pessoas após assistirem a discussão de assuntos como esse. “Eu vejo principalmente as pessoas que participam saírem daqui com uma outra consciência. A atitude delas é totalmente diferente. Eles já conseguem enxergar: eu não estou vendo um africano, ou um negro, mas uma pessoa”, descreve.

O aprendizado, segundo ela, também tem efeito positivo da parte de quem sabe o que é enfrentar atitudes das mais diversas por causa da cor da sua pele. “É interessante até para nós angolanos, porque geralmente dizemos assim: eu sou um negro com muito orgulho. Mas porque um negro com muito orgulho? Eu sou um ser humano com muito orgulho. Independentemente, se sou negro ou se sou branco, nós somos todos seres humanos. O que acontece também é que nós próprios temos esse grau de inferioridade. Muitas das vezes nós achamos que não conseguimos, que só brancos podem conseguir, mas não, você tem capacidade para isso, você precisa se impor”, ponderou.

Muitas dessas capacidades, potenciais e características da cultura africana foram expostas durante o fórum. Com a ajuda do curso de Nutrição, os universitários angolanos preparam pratos típicos da culinária angolana. O Mufete, prato principal comum nos almoços de sábado de famílias adventistas da Angola, foi servido após o encerramento do fórum com refrigerante feito de forma artesanal e sobremesa. Uma refeição completa que agradou aos participantes do fórum na hora do almoço.

O evento trouxe ainda uma exposição de quadros do artista plástico angolano Isidro Sanene. De referências cubistas, a proposta do artista traz um duplo significado que desejou mostrar através desse trabalho. “A ideia de pintar máscaras é no sentido de tentar explicar um pouco mais a respeito da perda de identidade do povo africano. É também uma provocação no sentido de que as pessoas muitas das vezes têm a ideia de que o africano normalmente é o necessitado e uma pessoa que vive sempre em dificuldade. São máscaras porque é como se o povo africano ainda não conseguisse ter uma identidade própria. É para tentar incentiva-los a mostrar aquilo que eles são fora do seu continente”, explicou.

Peças e acessórios do artesanato da aldeia Tenondé Porã também ficaram expostos e a venda enquanto acontecia o fórum. As apresentações artísticas também aconteceram através da música com as participações dos grupos Tom Sublime e Coral dos Angolanos.

A representante da Secretaria para a Promoção da Igualdade Racial da Prefeitura de São Paulo, Nair Novaes, lembrou que o fórum é um resultado dos esforços da Secretaria em envolver as instituições de ensino nas discussões dessa temática. Um assunto do qual o UNASP é parceiro. “Pensar e discutir a questão racial dentro das instituições privadas de ensino, para nós é um ganho, fruto de um trabalho que a gente vem realizando há muito tempo. É necessário pensar o currículo escolar. Não é pensar só em ações, mas é pensar em como você mexe nos cursos de graduação, nos cursos de licenciatura e de bacharelado para mudar uma política social existente”, destacou.

A quinta edição do Fórum para Questões Afro-Indígenas na Contemporaneidade foi organizado e apresentado pela coordenadora do Núcleo de Estudos Étnicos Raciais, Romilda Motta. O evento fez parte das comemorações do Centenário do UNASP-SP.

por Murilo Pereira

Fotos: Wilson Azevedo 

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